Minha avó materna e meu pai morreram com pouco mais de cinquenta
anos. E eu, cinquentona desajustada, uso saia justa e arrisco meio umbigo de
fora. O desejo, quando volta, me alegra. O sono, quando perco, me irrita. Os amores mais fortes permanecem congelados como
alimentos esquecidos no freezer. Não são comida caseira feita na hora. Ao longe, um
copo quebra, um samba toca, burburinhos da Lapa.
Estou no limbo.
Sou coroa, meio umbigo de fora, tenho uma casa alugada no útero de
Minas e outra no coração de Búzios. Não quero que me classifiquem. Minha filha
disse que sou barroca porque enfeito demais o apartamento. Tenho horror ao
vazio e ao silêncio. Meu ex-amante, que nunca se explica, diz que eu sou
prosaica, mas não se lembra de ter dito isso.
A memória dos ex cabe numa chicrinha.
Meu desejo é como uma caravela em busca de Américas. Quero um continente totalmente novo e assumo o risco do
naufrágio. Nunca uma geração que nasceu nos anos cinquenta viveu os cinquenta
depois da virada do século, e por isso eu sou parte de uma fatia de enxutas que
não pode ser estudada agora. O objeto da pesquisa está vivo e incerto.
Deixem-me para depois. Integro uma experiência em andamento, calma! O coração
raramente, mas dispara. Hormônios ainda gritam, prazo vencendo. Esperemos. A
vida será curta de qualquer maneira. Eu estou cansada, mas estou inteira.
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