Perdi a moça que me habitava. Quem conheceu a moça que fui guarde o seu retrato. Quem não viu perdeu a chance.
A pessoa que veio limpar a casa quebrou o espelho e nunca mais olhei-me por inteiro. Nunca mais esperei que ele telefonasse. Nunca mais quis abraçar o mundo. Há moças que nascem calmas. Eu quis comer o universo lambendo os dedos, e por isso a maturidade me soa estranha como uma música ao vivo sem ar e sem vento.
Leio-me e parece até que fiquei velha, é mentira. Ontem mesmo usei gargantilha de sementes grossas feitas na aldeia indígena e alisei os cabelos cortados retos, ficando com cara de Cleópatra. Pintei as unhas de vermelho e saí, ombros de fora.
Sou uma criatura ingrata. A vida me abre a palma da mão repleta de frutos para colher com parcimônia, mas eu me deixo influenciar pelos anúncios de juventude e invento que queria ficar congelada numa etapa da vida, e voltar para quando eu não tinha dinheiro para pagar as contas vencedoras e vivia fingindo que esperava o amor verdadeiro, ciente de que há coisas que não se colhe, se constrói, e outras para as quais não se tem vocação desde pequena.
Sonho que abro a porta e vejo minha mãe com minha filha. É disso que tenho saudades. De estar no meio, entre a proteção e o futuro.
Um comentário:
\\ Quem conheceu a moça que fui guarde o seu retrato.//
Eu guardei... ;-)
Sempre bom demais rever aquela foto... Todo tempo é bom, mas aqueles... :D
Bom te reencontrar querida,bjs
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