Finita como flores

18 de jul. de 2010

Meu nome é Maria

Acompanhar meu saldo bancário é uma tarefa mais misteriosa que a origem e o destino do universo. Entenderia a Cabala, os Arcanos, os Arquétipos. Na secretária eletrônica, uma voz de homem me pede pra ligar pro Banco com urgência. Ligo de volta e na minha agência ninguém sabe de nada. Está tudo bem com sua conta, Dona Maria, me dizem. Mais essa: virei Dona Maria. Meu nome é Glória, Maria da Glória, mas, por favor, me chamem de Glória, quase imploro. Não adianta. Continuam rebatizando-me. Nada contra Maria, acho até um nome bonito. Mas dos outros. Da minha sogra, da minha amiga Maria Borba, da mãe de Cristo, da vizinha. Há algum tempo eu me debato com essa questão de identidade. Tento enfiar na minha cabeça que EU SOU A DONA MARIA. Pois se é esse o meu PRIMEIRO nome. Todas as Marias da minha geração, Maria de Fátima, Maria Fernanda, Maria Cristina, Maria Isabel, Maria Cláudia (era moda no tempo do meu nascimento), todas viraram Dona Maria, como eu, a marca das contemporâneas. Tento conformar-me e aceitar a mudança como fazem algumas tribos de índios que recebem um nome novo a cada fase da vida.
Tensa, renomeada, preciso estudar matemática para a prova de domingo. Mas não consigo concentrar-me depois de tantos e enigmáticos telefonemas. Dona Maria está uma pilha, ilhada, irada, febril, sozinha.
Foi dado o veredicto. Fiz prova numa sala com oitenta Marias.

SENHORA
Primeiro estranhei. Hoje gosto que me chamem de senhora. Outro dia comprei uns biscoitinhos no camelô da esquina e o vendedor me peguntou:
-Tu vai querê sacola?
Quase disse:
Que intimidades são essas? Eu conheço o senhor, por acaso? Meu nome é Dona Maria e exijo ser chamada de SENHORA! É cego? Não está vendo que SOU uma senhora?

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